Instituto Ricardo Brennand

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Interiorano: Clávio Valença lança livro de contos em Recife

O advogado e escritor Clávio Valença, natural de São Bento do Una, da tradicional família Valençalança hoje (16) o livro “Interiorano”, composto de 13 contos inéditos.

A obra do escritor sãobentense, será lançado em Recife, a partir das 18h30, no Museu do Estado de Pernambuco, localizado na Avenida Rui Barbosa, 960, Graças. Você que está em Recife, prestigie. 

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MALDITO RADINHO DE PILHA


De Clávio Valença


Publicado no Jornal do Commercio, Recife, em 29.08.2009


Jovem, bonita, casada e solitária, minha amiga fazia hora a conversar miolo de pote no apartamento da vizinha, ao som de pouco interessante programa de rádio, quando foram surpreendidas ao ouvir seu nome ser pronunciado. Nome pouco comum atraiu sua atenção para a forma como falado pelo apresentador, num misto de intimidade e ternura. De imediato sentiu-se atraída pela voz que a acariciava sussurrando. Não resistiu e correu para casa onde, sem dificuldade maior, sintonizou a emissora. Dias passados já descobrira toda a escala de trabalho do locutor e, telefonando-lhe com insistência, conseguiu marcar encontro durante à tarde, em ponto de grande movimento no Centro. Dele, ouviu ser casado e fidelíssimo à esposa. Não adiantaria tentar nada. No que dizia no microfone visse somente a profissão.

Desesperada voltou ao lar para, após horas de meditação, concluir estar apaixonada e, mesmo platonicamente, haver traído o marido. Melhor confessar-lhe, o que fez à noite, logo ele terminou de jantar.

Para satisfazer minha curiosidade, encerrou o relato: Levei uma surra, ele vendeu o telefone e jogou o radinho pela janela.

Assim ficou resolvido o problema. Vivem felizes, faz anos. O rádio estava sobrando na relação.

Em minha casa, se dava o contrário. Desde que, também faz anos, deixei de ir a campo, penava nas quartas-feiras para saber o andamento e resultados dos jogos do Santa Cruz. Mais barato fosse um radiozinho, nunca pude comprar. Padecia sua inexistência nas quartas e a esquecia nas quintas pelas manhãs.

Um dia, em São Paulo, comentei sobre isso com um amigo. Dormi na residência dele e, logo cedo, ao sairmos para o aeroporto, lembrou: Esta primeira gaveta tem vários rádios, escolha um e leve. Não pestanejei. O mais bonitinho, em segundos, estava na minha maleta. Em Recife, com quatro pilhas novas, alcalinas, especialmente adquiridas, descobri ainda não ser proprietário de um rádio. Na verdade trouxera um gravador.

Meses depois, testemunha de minha desolação semanal, minha mulher aproveitou um aniversário e deu-me um rádio. Este, pequeno, porém com tudo que um receptor precisa. Ondas, faixas, potência, eletricidade e pilha. Tudo, só não tinha capacidade de fazer o Santinha ganhar algum jogo. Pelo contrário, deu um azar dos diabos. Foi o que todos sabem. Primeira, segunda, terceira e quarta divisões.

Esta semana, como o marido da minha amiga, entendi que o mal estava mesmo na descoberta de Marconi. Para não sacudir pela janela, correndo o risco de atingir alguém, saí levando o azarado para a lixeira da esquina. Estou certo que Zé Neves e o filho do meu amigo Romero Jatobá nenhuma culpa tiveram. Atletas e técnicos que passaram também não. Se Bezerra Coelho não conseguiu tudo que dele espero (e continuo esperando), não duvidem, o responsável é o meu radinho.

Antes de chegar ao destino pretendido, entretanto, avistei garoto fazendo malabarismo com varetas em chamas, logo no primeiro semáforo. Ele vestia, olhei bem, camisa rubro-negra, rasgada na manga, com leãozinho amarelo no peito. Parei e dei-lhe o presente que recebeu agradecido. Coitado. Vai ver.

Mal sabe do que me livrou. Agora é só esperar. Sem o maldito, tudo fica fácil. Se não foi nesta série D, outros campeonatos virão. Avante Tricolor!

Confesso, já comecei a pesquisar preços de passagem, hospedagem e ingresso para o jogo decisivo interclubes em Dubai, 2012. Afinal, sabe-se, compradas com antecedência as passagens saem, sempre, bem mais baratas.